domingo, maio 11

Olhos negros

Aqueles grandes olhos negros, escondidos por óculos fundo-de-garrafa, brilhavam sempre que se deparavam diante de uma boa leitura. Liam e reliam centenas de vezes tudo o que julgava interessante e sempre guardava as preciosas informações para aplicá-las na vida.

Leituras que gerariam uma infinidade de conseqüências no futuro daqueles olhos. Chegaram até a serem expulsos de casa por entrarem em contradição com o pai. Eram desprovidos de amigos. Perambulavam sempre solitários como quem procura loucamente por um refúgio. Na faculdade, freqüentemente conversavam com seus professores. Política, economia, polêmicas... E os mestres se mantinham estáticos, calados, impressionados com o alto grau crítico que aqueles olhos dispunham.

Logo antes do término do ensino superior, conseguiram um bom emprego. O chefe os admirara até o dia em que estes grandes olhos negros, e somente eles, de uma firma de mais de mil funcionários, foram reivindicar os seus direitos trabalhistas, desconhecidos por muitos, até mesmo pelo chefe. Resultado: demissão.

Trancados em um apartamento, à luz turva de uma vela, começaram a escrever livros. Ou eles se manifestavam ou se tornariam submissos. Preferiram a primeira opção. Publicaram de críticas a romances e poesias. Em suas resenhas era típico o semblante de indignação das pessoas que liam. Não usavam apenas palavras bonitas ou citações de filósofos famosos, mas articulavam com fatos, dados reais e indeléveis de uma sociedade. Nem mesmo a revista mais renomada no país escapou aos olhos afiados. Enfrentavam poderosos, apoiavam os fracos e superavam derrotas.

Levava uma vida a estilo Olga Bernardes: perseguição, prisão, exílio. Em uma noite de lua cheia, ouvira um barulho. Pareciam fogos de artifício, mas não era. Sentira a cabeça esquentar. A noite já não era mais clara, as nuvens fecharam a lua e tudo penumbrou. As linhas retas dos paralelepípedos transformaram-se em grandes curvas sinuosas. Ouvia zumbido, sons que não sabiam de onde vinham. Levou as mãos à cabeça. Sentiu algo úmido. Pólvora, sangue... Morte.

E este é o preço que se paga por saber demais. E aqueles grandes olhos negros só queriam justiça. Só queriam ser cidadãos.


 

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Anônimo disse...

tou eu aqui mais uma vez... hehe
esse eu lii na integra,tah massa!
já posso dizer que és... uma escritora ^^
Parabéns! amiguxa...
saudadesss...
bjosss ;*

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